sexta-feira, 1 de abril de 2011

"Miguel, Miguel da manhã..."

"Miguel, Miguel da manhã..."


Esta é a verdadeira história de um "marine" (fuzileiro naval) ferido na Coréia, em 1950. Escrevendo para sua mãe, ele lhe contou sobre um encontro fascinante que teve durante a guerra. O Padre Walter Muldy, capitão da Marinha, que conversou com o fuzileiro e sua mãe, e também com o comandante da unidade militar do jovem - sempre afirmou a veracidade desta narrativa. Nós a ouvimos de uma pessoa que leu a carta original e narra à história em seus mínimos detalhes e na primeira pessoa, para melhor transmitir algo do impacto que o fato deve ter causado quando - pela primeira vez - foi contada pelo filho à sua mãe.

Querida mamãe:

Escrevo à senhora de uma cama de hospital. Mãe, estou bem.  Fui ferido, mas o doutor disse que logo estarei de pé. Mas, não é sobre isso que eu preciso escrever-lhe.  Algo aconteceu comigo que não ouso contar a ninguém com medo de que não acreditem.  Mas, preciso contar a senhora - única pessoa em quem posso confiar, embora mesmo a senhora possa achar difícil de acreditar.

A senhora se recorda da oração a São Miguel que a senhora me ensinou a rezar, quando eu era pequeno?  "Miguel, Miguel da manhã..." Antes de partir para a Coréia, a senhora recomendou com insistência que eu me lembrasse dessa oração antes de qualquer confronto com o inimigo. Mas, realmente, mãe, a senhora não precisaria me ter lembrado isso. Eu sempre a rezei e quando cheguei à Coréia, freqüentemente eu a rezava, várias vezes durante o dia, enquanto marchava ou descansava. 

Bem, um dia, fomos convocados para fazer um reconhecimento em busca de Commies (NT: nome dado aos guerrilheiros comunistas). Era um dia em que fazia muito frio. Quando já havia caminhado um tanto, percebi outro soldado andando ao meu lado e eu olhei para ver quem era. Era um rapaz alto, um fuzileiro de cerca de 1,90m e constituição forte. Estranho, mas eu não o conhecia e pensei que nunca o havia visto em minha unidade. Fiquei satisfeito por ter companhia e quebrei o silencio entre nós.

- “Faz frio, hoje, não?" Comecei então a rir baixinho, porque, de repente me pareceu um absurdo conversar sobre o clima, quando estávamos avançando para enfrentar o inimigo!

Ele também riu suavemente.

-"Acho que conheço todo mundo em minha unidade", continuei, "mas nunca o vi antes". 
- "Não", ele concordou. "Eu acabo de chegar, meu nome é Miguel!"
- "Verdade? É meu nome também". 
- "Eu sei" - disse o fuzileiro. "Miguel, Miguel da manhã..."

Mamãe; fiquei realmente surpreso que ele soubesse assim minha oração, mas eu havia falado dela a tantos rapazes, que supus que o recém-chegado ouvira falar disso através de algum deles.  Na verdade, isso se tornara tão conhecido, que alguns de meus companheiros me chamavam de "São Miguel".

Então, de repente, Miguel disse:

- "Vamos encontrar problemas à frente".

Surpreendi-me, pois não podia perceber como ele sabia disso. Eu respirava fortemente, por causa da marcha e meu hálito enchia o ar frio com densas nuvens de neblina. Miguel parecia estar em ótima forma, porque eu não percebera sua respiração, até então.  Nesse momento, começou a nevar tão fortemente, que logo não mais pude ouvir ou ver o restante da minha unidade. Fiquei um pouco assustado e gritei:

- "Miguel!"

Senti, então, sua forte mão em meu ombro e ouvi sua voz:

- "Vai clarear logo".

De repente, a nevasca parou. E então, a uma pequena distância de nós, assustadoramente reais, estavam sete Commies, eu diria quase cômicos com seus chapéus típicos.  Mas não havia nenhuma graça em suas atitudes: suas armas estavam engatilhadas e apontadas exatamente em nossa direção.

- "Para baixo, Miguel", gritei, e mergulhei para me proteger. 

No chão, olhei para cima e vi Miguel ainda em pé, paralisado, e achei que era por medo, como julguei naquele momento. Balas espocavam de todos os lados e, mamãe, não havia lugar que os comunistas não atingissem a tão curta distância.

Pulei para fazê-lo deitar-se e foi então que fui ferido. Senti a dor como uma forte queimadura em meu peito e desmaiei. Enquanto ia perdendo os sentidos, ainda me recordo que pensei: "devo estar morrendo". Alguém estava me erguendo, braço forte me seguravam e me colocavam, com cuidado, sobre a neve. Apesar do choque, abri os olhos e o sol pareceu penetrar neles.  Miguel ainda estava em pé e havia um enorme clarão em sua face. De repente, abrasou-se como o sol, um resplendor o rodeava intensamente, como as asas de um anjo. Quando perdi a consciência, ainda vi que Miguel segurava uma espada em sua mão e que ela faiscava como milhares de luzes.

Mais tarde, quando recobrei os sentidos, meus companheiros vieram me ver, com o sargento.

- "Como você fez isso, filho?" – ele me perguntou.
- "Onde está Miguel?" O sargento pareceu intrigado.
- "Miguel, o fuzileiro alto, que andou comigo até o último momento. Eu o vi, quando desmaiei"
- "Filho - o sargento disse gravemente - você é o único Miguel em minha unidade. Posso pesquisar entre todos os demais soldados, mas só há um Miguel - você. E, filho, você não estava caminhando com ninguém. Eu o observava, porque você se distanciou muito de nos, e fiquei preocupado. Agora, conte-me, como você fez isso?"

Era a segunda vez que me fazia essa pergunta, e eu me irritei.

- "O que eu fiz?"
- "Como você matou aqueles sete guerrilheiros comunistas?"
- "O quê?"
- "Vamos, filho, eles estavam estendidos ao seu redor, cada um morto por um golpe de espada".

Este, mamãe, é o fim de minha história. Pode ter sido o ferimento, o clarão. Do sol ou o frio. Eu não sei mamãe, mas de uma coisa estou certo: ISTO ACONTECEU! ...

(Traduzido de: Crusade – Nov/dez - 2002. Tradução com pequenas alterações para adaptar ao português).

PS: Retirado do "O Desbravador" - Janeiro de 2004)