terça-feira, 30 de março de 2010

Golpe profundo (Matrimônio)

Golpe profundo


O primeiro e mais profundo golpe no matrimônio nos tempos modernos foi vibrado pelo Protestantismo. Os "reformadores" do século XVI negaram-lhe qualquer caráter religioso e sacramental. Lutero renovou os erros dos gnósticos e albigenses, ensinando que o matrimônio é tão imoral como o adultério e a fornicação.

Mas, incoerente e desabrido, dizia que a concupiscência da carne é invencível - e concluia, contraditório e inconsequente, pela obrigatoriedade do matrimônio e pelo absurdo da virgindade e do celibato. Para tirar-se do impasse, afirmava que Deus não impunha aos homens as desordens do matrimônio.

Uma verdadeira seara de erros perigosíssimos.

a) O matrimônio não é religioso, mas profano. Eis a primeira e mais terrível "profanação" do matrimônio. Calvino chegou a dizer que o matrimônio é tão sagrado como o trabalho do campo... Daí nascerão todas as demais profanações, como de sua fonte.

b) As teorias da "necessidade fisiológica", da nocividade da continência, etc., hoje tão correntes e perniciosas, estão em Lutero.

c) A equiparação da vida conjugal com as desordens extra-conjugais, ensinada por ele, levaria os costumes às facilidades atuais.

O resto é conseqüência.

Os evolucionistas ensinaram que a constituição da família veio tardia, por imposição da sociedade, no desejo de organizar-se. Negavam assim ao matrimônio caráter religioso, tanto quanto os "reformadores", e punham o matrimônio às mãos dos homens, à sua mercê, como obra deles, por eles criada e afeiçoada, por eles também, decerto, desmontável e reformável!

Os próprios comunistas, declarando o matrimônio uma invenção burguesa e artificial, nada acrescentavam. E só inovaram nos processos de nivelamento com as uniões livres - nivelamento que Lutero teoricamente ensinara e que os evolucionistas insinuavam, mas sem coragem de realizar.

Sacudindo o jugo divino e fazendo-se árbitros dos destinos humanos, os Estados (preparando a hipertrofia totalitária), arrogaram-se o direito de fazer casamentos! Assim, não somente desconheciam o caráter sagrado do matrimônio, mas o negavam, considerando nulo e inexistente o verdadeiro matrimônio, dando força legal apenas ao chamado "casamento civil".

Se podiam fazer, podiam também desfazer: veio o divórcio!

A propaganda

A dignidade do matrimônio, seus fins, seu caráter religioso, seu vínculo indissolúvel, sua própria necessidade estão padecendo uma espécie de guerra total.

Livros e folhetos - desde a publicação ligeira, de pura divulgação popular, ao livro sedizente científico - andam de mão em mão. Editores se especializam na infeliz empreitada. A idéia central é sempre substituir o conceito de matrimônio como instituição divina e natural, por um conceito inteiramente humano, que deixa o casamento nas mãos dos homens como coisa sua e a seu bel-prazer.

Ou fazer tábua rasa de tudo o que não seja o amor - palavra com que romances e folhetins denominam a paixão impura, para assim soltar mais facilmente as rédeas do instinto. Desde que se amem, é tudo permitido!

Recrudesceu, desde há tempos, a campanha neomaltusiana. Uma enxurrada de livros mal orientados justifica e ensina o mais desabrido anticoncepcionismo, alimentando o egoísmo dos cônjuges, abrindo caminho à infidelidade de esposas, derrubando a barreira que ainda protegia certas virgindades condescendentes...

... Na mesma esteira navegam os divorcistas. Seus argumentos refutados nas escolas e nos seminários, em livro de alto saber, grande tomo e muito preço, andam na mão do povo, quebrando resistência, fazendo corrente, firmando convicções, preparando ruínas.

Muito mais difundidos e eficazes vêm outros meios de propaganda antimatrimonial.

O cinema martela sem cessar os temas amorosos, num amoralismo absoluto, com desprezo da organização doméstica em favor da mais desenfreada liberdade de costumes. Não admira que os temas sejam divórcios, adultérios e amor livre, quando os "astros" e as "estrelas" outra vida não vivem, na realidade.

Os teatros, as emissoras radiofônicas, as revistas descem às raias do incrível, na desmoralização do casamento e da fidelidade conjugal, na glorificação do amor livre, no culto da pornografia e da obscenidade.
E é dever ver como são preferidas as peças mais desabridas, os programas mais incovenientes, os "artistas" mais audaciosos, as sessões mais apimentadas. As anedotas correm de boca em boca, as piadas reventam gargalhadas soezes, as facécias se firmam em modismos de falar. É a aceitação inconsciente pela opinião pública.

Os erros, difundindo-se, criam uma mentalidade de vício e dissolução. O daltonismo moral chega a tais deformações que o vício passa a ser aceito, defendido e louvado, enquanto a virtude passa a ser mal vista e ridicularizada.

E os homens vão cedendo à pressão da propaganda. Relaxa-se a resistência moral, condescendem os tribunais, modelam-se novas leis à feição das capitulações, a sociedade inteira se acomoda...

Só a Igreja resiste! E Ela só! Porque mesmo os católicos vão capitulando. Sem formação, sem doutrina, sem resistências morais porque sem prática e sem Sacramentos, são vítimas igualmente fáceis dos erros correntes.

"Esses erros extremamente perniciosos - reconhece a Encíclica Casti Connubii - e esses costumes depravados começaram a difundir-se mesmo entre os fiéis, e tendem a insinuar-se insensível e cada vez mais profundamente".

(Excertos do livro: Noivos e esposos - Pe. Álvaro Negromonte)

PS: Grifos meus

A dor aperfeiçoa as almas, como um escultor tornando-as mais belas

 A dor aperfeiçoa as almas,
como um escultor tornando-as mais belas


Ah! Mãe de todas a mais aflita!
Ó Maria, a Vós é imposto assistir Jesus moribundo,
mas não vos é facultado procurar-Lhe alívio algum.

Maria ouve o Filho dizer que tem sede,
sem que Lhe seja permitido dar-Lhe um pouco de água para dessedentá-Lo.
Pode dizer-lhe apenas, conforme as palavras de São Vicente Ferrer:
"Meu Filho, tenho tão somente a água de minhas lágrimas."
(Santo Afonso Maria de Ligório)


Detenhamo-nos um momento neste vértice: ele é luminoso. A dor não fere, pois, somente aqueles que se esquecem de Deus neste pobre mundo, nem os que aqui se corrompem. Os justos também sofrem; os bons também têm mágoas. Eles sofrem para se tornarem mais justos; têm provações que os tornam melhores. Discutamos sem pressa esta questão. Iluminados pela triste, porém, penetrante luz da dor, vamos começar a compreender a vida.

Quando se saberá que o homem é o seu próprio escultor; que Deus o colocou na terra no estado de gérmen, precisamente para que ele se criasse; para que desse mármore frio e informe, sem individualidade, personalidade nem beleza, o homem tirasse uma estátua viva? Mas, principalmente, quando se saberá que, neste trabalho, Deus lhe deu a dor como auxiliar?

Ó homem, não eras belo, grande nem santo; e o és agora. Porque? Porque sofreste.

Vede como nascem os homens. Todos no estado de gérmen. Alguns disformes; os melhores apresentam um fundo estéril e seco, uma seiva áspera. A criança é impiedosa, disse um grande observador. O jovem revela pouca sentimentalidade; a sua vivacidade natural, o seu entusiasmo não vem do coração; e nas suas palavras imperiosas, nos gestos de desdém, ele manifesta a ausência de bondade.

O seu coração não nasceu ainda, diz-se então. Tem graça, espírito, imaginação, ciência; no entanto, não fala bem. Que lhe falta? A dor, que ele não conheceu ainda.

O tempo, as provações, os sofrimentos submissamente suportados são elementos indispensáveis para que o coração adquira doçura e a alma a sua elevação, a sua beleza moral.

Certas cordas, e são precisamente as mais belas, só vibram no homem quando as lágrimas as umedecem. E é por isso que a dor é tão abundante. A onda que vem, não espera que a vaga precedente tenha passado. Dores do espírito, dores do coração, moléstias e sofrimentos de todas a espécie, a inextinguível amargura corre indefinitidamente e envolve a vida inteira.

Porque? pergunta o homem, atônito.
Porque se esvai continuamente a felicidade?
Porque a dor jamais finda?

Porque? Para que nos aperfeiçoemos para que nos cinzele o lento e delicado trabalho do buril.

A uns são aplicados esses grandes golpes da dor, semelhantes às possantes marteladas com que Michelangelo tirou do bloco de mármore a estátua de Moisés. Outros só têm esse contato contínuo, minucioso, penetrante e delicado do torno que dá a um diamante a sua beleza, o seu brilho, o seu fogo. Mas tanto em um quanto nos outros, em todas as almas, a mesma operação inteligente da dor as auxilia nas aspirações da beleza perfeita.

A dor cabe, portanto, uma pesada e incessante tarefa; não vos surpreenda, pois, a sua freqüência. Ela se aplica com insistência nos vossos pontos frágeis. Sois fraco; cumpre que ela vos torne forte; sois forte; convêm que ela vos torne fraco.

Eis uma pessoa cujo coração é afetuoso; a dor vem feri-la, para proporcionar-lhe no sacrifício e no esquecimento de si mesma um amor que não seja muito humano, porém nobre, elevado, ativo e perseverante. Eis outra cujo caráter é firme e generoso, mas cuja personalidade se expande exageradamente; a dor acode em seu auxílio.

Cumpre, certamente, que as lágrimas venham vivificar essa sensibilidade que se extingue ou esse amor que se dissipa. Almas tão altivas, tão pessoais, que vos deleitais na contemplação do vosso "eu", espere a dor; ela vos forçará a amar. E vós, corações amorosos, esperai-a também, receiosamente. Ela só permitirá que a vossa sensibilidade se torne generosidade e virtude.

Nós nos compreendemos, seguramente bastante o trabalho inteligente da dor; adoraríamos a mão invisível e terna que dirige o buril, se tivéssemos essa nítida percepção.

Quando não nos lisonjeamos e contemplamos calmamente a nossa alma, causa-nos surpresa a maneira justa e precisa pela qual a dor nos feriu.

E não somente ela desperta a alma com inteligência, revelando-lhe as lacunas, as sombras, os vícios, dando-lhes qualidades que lhe faltam; como também, muitas vezes, o seu cinzel se aplica nos pontos em que mais virentemente florescem as virtudes. Porque?

A fim de as fortalecer e aumentá-las, a fim de as desembaraçar de todo e qualquer obstáculo ao seu desenvolvimento. Sois paciente e bom; sereis assaltado por toda a sorte de enfados; sois generoso, vivereis entre egoístas. A vossa mais alta virtude será justamente a menos conhecida; a vossa mais bela qualidade procurará debalde a sua aplicação.

Apraz-vos a vida íntima da família, é possível que toda a vossa existência se passe sem a companheira desejada, ou talvez a percas pouco depois do vosso casamento. A vossa alma acariciava todos os sonhos da paternidade; nunca tereis filhos. Se tendes na alma um ponto sensível, é exatamente ali que a dor aplicará o seu buril; e embora a ninguém o tenhas revelado, a dor achará esse lugar. E si, por acaso, vós mesmo não conhecieis esse ponto, a dor vo-lo mostrará.

Compreendeis, portanto, que a dor é apenas um instrumento manejado por Alguém que conhece a vossa alma.

Quero indicar-vos outras provas disso.
Já notastes com que arte a dor se proporciona ás almas?

Sobe e desce, eleva-se ou abaixa-se com elas; faz-se delicada ou grosseira, conforme for necessário. Não sois sensiveis ás dores delicadas da alma; Deus vos enviará as duras fadigas do corpo. Não sentis as nobres preocupações da honra; Deus vos dará as penas vulgares da fortuna. Não vos magoam os santos sofrimentos do coração; Deus vos sugerirá as inquietações do espírito: não erra nunca o seu alvo, porquanto, se não puder atingir-vos a alma, ferirá o vosso corpo.

Vede, no entanto, como a dor se espiritualiza á medida que as almas se desprendem da terra.

Quem descreverá jamais sofrimentos sutis, incompreendidos pela multidão, reservados ao homem de gênio, ao poeta, aos espíritos superiores?

Como seria narrado ao martírio invisível e sublime que Deus opera no coração das mães, no enlevado coração das virgens e sos santos?

A vida é um crisol em que as almas se formam para o Céu; e nesse crisol elas são sempre afagadas pela chama que convêm á sua natureza. Vós que compreendeis o mistério da dor e aspirais á elevação e á santidade, deixai que o sofrimento vos torture.

Quem dirige o buril que vos fere, sabe melhor do que vós onde e como é necessário aplicá-lo.

Isto me conduz a outro ponto de vista ainda mais digno da nossa atenção, e do nosso interesse, tantos são os aspectos multiplos que se nos apresentam.

A dor supre o amor.
(Excertos do livro: A Dor - Monsenhor Bougaud)

PS: Grifos meus.

segunda-feira, 29 de março de 2010

Maternidade

Maternidade

Dois aspectos da maternidade

A Maternidade humana tem dois aspectos: trazer ao mundo uma nova vida, o que pressupõe a cooperação de um pai; e trazer ao mundo uma nova personalidade ou seja um novo "eu", o que implica a cooperação de Deus...

A mãe, em ambos os desempenhos, como geradora de vida física, e como cooperadora de Deus, está trabalhando pela sua própria salvação. A maternidade, mesmo em seu aspecto puramente físico, tem uma propriedade salvadora, pois a Escritura afirma que a mulher encontrará sua salvação na geração da prole (Timóteo 2,15).

A mãe é também glorificada em seus filhos, que espelham pelas suas vidas afora a graça de Deus que através dela lhes foi concedida. São os filhos que tornam as mães famosas; ao deparar com um filho digno, havará sempre quem exclame, como fez, entre a multidão, a mulher que gritou para Cristo: "Bem-aventurado o ventre que te trouxe e os peitos a que foste amamentado" (Lucas 11,37(.

A mãe é duplamente benfeitora da humanidade: preserva-lhe a vida física e defende-lhe a vida moral.

Por meio da vida, e das altas qualidades dos filhos que gerou, ela é um desafio constante que o universo apresenta à morte...é depositária das realidades eternas. É bem possível, hoje em dia, que as mulheres que têm tanto horror a ter filhos vejam apenas a maternidade no seu primeiro aspecto de mera procriação, e não no seu segundo aspecto de cooperação com Deus, para maior difusão do Seu Reino e maior glória do Seu Corpo Místico.

A maternidade perde metade de sua beleza, quando considera o nascimento como um mero processo biológico e desconhece o ponto de vista teológico. Se o amor for apenas um entendimento entre marido e mulher, e não uma cooperação entre homem, mulher e Deus, - então ele perde grande parte de seu encanto.

Diz Santo Tomás: "É muito melhor e mais belo unir-se àquilo que é superior, do que preencher as falhas do que é inferior".

A mulher não é uma restauradora de ruínas; ela é, antes de mais nada, uma cooperadora de Deus. Anexando à sua cooperação com o homem, a sua cooperação com Deus, ela reafirma mais uma vez o segredo do casamento: são necessários três elementos ao amor: homem e mulher, como princípios geradores, e Deus, para insuflar a alma imortal.

Limitação da prole

A limitação da prole é uma decisão deliberada e consentida por parte dos esposos, a fim de negarem a Deus a possibilidade de criar um novo ser à sua imagem e semelhança. É a vontade humana opondo-se livremente à vontade divina, da mesma forma que certos sistemas agrícolas controlam propositadamente a produção da terra, a bem de um maior aproveitamento econômico. O non serviam de Lúcifer teve seu efeito catastrófico sobre a Criação, e principalmente sobre aqueles que dizem:

"Recuso-me a aceitar de Deus a Sua Santa Vontade, que é a multiplicação, pois Nosso Senhor, referindo-se aos dons inaproveitáveis, disse: Tire-se dele o talento".

A opinião médica mais corrente hoje em dia é atribuir as psicoses e neuroses femininas a essa fuga da maternidade. Uma mulher que tivesse uma árvore plantada em seu jardim, não iria todas as noites cortar com a tesoura cada pequenino galho que pudesse crescer sobre o telhado. Essa mulher sabe que o normal é que a árvore espalhe seus galhos ela também sabe que uma determinada limitação de galhos, ou seja, permitir que a árvore de um novo galho apenas cada cinco anos, seria prejudicial tanto às árvores como aos galhos.

Essa limitação acabaria por matar a árvore. Estatisticamente falando, é aliás o que acontece. De cada seis casos de divórcio, cinco são de casais que não tiveram filhos.

Maternidade: Heroísmo contínuo

... Em nossas vidas cristãs individuais, muito de nós cuidamos separadamente da alma e do corpo. Muitos dias são dedicados à melhoria de nosso físico: muito poucos minutos são reservados para os cuidados espirituais.

A maternidade é um lembrete de que as melhores vidas são aquelas em que o desenvolvimento físico e espiritual caminham simultaneamente, como acontece com uma mãe educando seu filho: ambos crescem juntos. Justamente por causa da alma, há um desenvolvimento físico a cada instante.

A mãe cristã é como Simeão, que tomou em seus braços, o Infante Divino, com seus quarenta dias de idade. Mas o verdadeiro aspecto da questão, não é que ele tenha sustentado a Criança, mas sim que a Criança o tenha sustentado.

Da mesma maneira a mãe verá que não só fisicamente ela carrega a criança, como também a criança, composta de corpo e alma inseparáveis, serve-lhe de sustentáculo. O novo ser que ela abriga em seu ventre, vem de Deus, da mesma forma que a graça vem à alma através de Deus. Essa verdade espiritual é inseparável do desenvolvimento físico da vida dentro do seio materno.

... Quando finalmente dá à luz, a mãe verdadeiramente cristã esforça-se para que o desenvolvimento físico e moral de seu filho caminhem simultaneamente, a fim de que a criança, sadia de corpo, seja continuamente vivificada por uma vida espiritual intensa, o que provará ao mundo que a santificação do corpo da alma é simultânea.

Os pensamentos elevados e dignos que tiver uma mãe grávida, afetarão beneficamente o filho de suas entranhas, da mesma maneira que os sustos e os choques lhe serão prejudiciais.

São tremendos os efeitos psicológicos que o amor produz sobre o próximo. A mãe que gera o filho por amor, consciente de estar obedecendo ao preceito divino e desincumbindo-o de uma missão sagrada, verificará em sua vida a veracidade das palavras de Nosso Senhor:

"Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e meu Pai o amará, e nós viremos a Ele, e faremos Nele morada" (João 14,23). E a seguir, a criança lhe servirá de suporte, o que é a última prova do amor de Deus pela mãe...

A mãe é como a terra na qual se desenvolvem as sementes da adolescência.
O Evangelho nos fala de quatro tipos de mães:

"E quando semeava, uma parte da semente caiu ao longo do caminho, e vieram as aves do céu e comeram-na. Outra parte, porém, caiu em lugar pedregoso, onde não havia muita terra; e logo nasceu, porque não tinha profundidade de terra. Mas, saindo o sol, queimou-se; e porque não tinha raiz, secou. Outra parte caiu entre os espinhos; e cresceram os espinhos e a sufocaram. Outra parte enfim, caiu em boa terra, e frutificou: uns grãos renderam cento por um outros sessenta, outros trinta. Quem tiver ouvidos para ouvir, ouça" (Mt. 13,4-9)

Como depositária das sementes, a mãe se entrega completamente a Deus, dizendo como Maria: Ecce ancilla Domini. "Eis aqui a Serva do Senhor".

A terra apresenta uma submissão passiva às sementes, muito embora tenha que submeter-se ao sacrifício da escavação e do plantio. Ao passo que a submissão da mulher é inteiramente feita à base de sacrifício. Uma mulher tem muito maior capacidade de sacrifício do que o homem. O homem é capaz de heroísmo, em uma explosão momentânea e apaixonada de coragem.

Mas a mulher é heróica através dos anos, dos meses e às vezes até dos segundos da vida cotidiana, embora o caráter de repetição monótona de seus esforços possa dar-lhe a falsa aparência de banalidade. Não apenas seus dias, também suas noites, não apenas seu espírito, também seu corpo, participam do Calvário da Maternidade. Por conseguinte, a mulher tem melhor compreensão da redenção do que o homem, pois ela se acerca mais da morte, ao gerar a vida.

Na mãe estão reunidas as duas grandes leis espirituais, que em outras pessoas, são extrínsecas e separadas: o amor do próximo e o amor do sacrifício.

Todos os seres humanos, a não ser as mães, amam o próximo quando amam algo fora deles próprios. Mas o próximo para uma mulher grávida, está dentro dela própria e por ela deve ser amado. Geralmente se entende por sacrifício aquilo que se realiza fora da carne, mas o sacrifício da mãe é parte integrante de sua própria carne.

Não sendo um sacerdote, levando Deus aos homens e os homens a Deus. Leva Deus aos homens formando o corpo em cuja alma o Poder Divino já está presente. Conduz os homens a Deus pelo renascimento batismal, no qual ela oferece seu filho a Cristo. Reflexo terreno da maternidade de Maria, também a mãe pode ser glorificada com um Ave-Maria terreno!

Ave, Maria.
Ave, Mãe.

Cheia de graça!
Cheia de vida; um corpo, produto do amor do marido pela  mulher; uma alma, produto do amor de Deus.

O Senhor é convosco!
Deus está com as mães. "Aquilo que fizerdes a quem quer que seja, o estais fazendo a Mim".

Bendita sois entre as mulheres.
Toda mulher sofre um apelo à maternidade, seja física ou espiritual. Uma mulher será tanto mais feminina, quanto mais cristã ela for. Uma mulher será tanto mais esposa, quanto mais ela for mãe.

E bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus.
E bendito é o fruto do teu ventre - João, Pedro, Maria, Ana. "Bendito seja aquele que vem em nome de Deus".

(Excertos do livro: O mistério do Amor - Arcebispo Fulton J.Sheen)

PS: Grifos meus.

Cultivai o santo recolhimento

Cultivai o santo recolhimento

Daí ao próximo as chamas de vosso coração delicado, mas deixai a este no Coração de Jesus, e nada tereis a recear, nada a temer.

Cultivai o santo recolhimento, isto é, vivei em sociedade de vida, de união e de amor com Deus, com Nosso Senhor. O santo recolhimento é a raiz da árvore, a vida das virtudes e até do amor divino: é a força da alma concentrada em Deus para daí irromper e expandir-se.

Que Nosso Senhor vos conceda essa Graça das graças.

Permanecei sempre no interior, vivei em vosso interior, possui-vos, virai-vos de fora para dentro, deixai este mundo; retirai-vos com Jesus em vosso coração, onde Ele vos move a alma, falai-Lhe a linguagem interior que só o amor entende e compreende.

Entretei uma doce e habitual conversação em vosso interior e não o percais de vista, se quiserdes conformar-vos àquele que dizia: "Jesus é minha alegria e felicidade!" Lembrai-vos deste princípio de vida, de que só encontrareis felicidade no serviço de Deus na vida interior de oração e de Amor.

... Amai, por conseguinte, a solidão da alma. É o santuário de Deus, onde enuncia os seus oráculos de amor. Aí aprendereis em pouco tempo, e sem dificuldade, a conhecer a Deus em pouco tempo, e sem dificuldade, a conhecer a Deus em Sua Luz, e degustá-Lo na essência de Sua Bondade, a imitá-Lo em seu espírito de Amor. Em tal escola estamos sempre a recomeçar, porque estamos sempre a meditar numa verdade nova; penetramos mais adiante nas profundezas da Ciência e da Virtude de Deus.

Ah! Acreditai-me quando vos recomendo a oração de silêncio, de contemplação, de união a Nosso Senhor; é o único verdadeiro centro de vida.

... Numa palavra, colocai-vos em Deus e estareis em Vosso centro divino. Tudo o mais é lida penosa e difícil para a alma, que então trabalha demasiado; mas aqui é Deus que trabalha nela, é o orvalho celeste que a penetra com suavidade. É mister correr a Deus pelo caminho mais curto e estar sempre a redobrar as forças.

(Excertos do livro: A Divina Eucaristia - São Pedro Julião Eymard)

PS: Grifos meus

domingo, 28 de março de 2010

Asseio e arte - (Lar cristão)

Asseio e arte
(Lar cristão)


Agradável pelo asseio e pela arte;
quente e acolhedor pelo teu devotamento;
confortável pela ordem e trabalho -
farás de teu lar uma -
atração e uma saudade.

Não se discute que a falta de asseio desacredita uma dona de casa. Que se refira esse desasseio à casa ou à pessoa de sua dona, é a mesma coisa.

A beleza e asseio de uma casa influem sobre a moral do homem por causa de certa força secreta. Numa casa bem asseada, ordenada, inundada de luz, exercita-se a vigilância, a linguagem e os pensamentos são mais cultos, o caráter é mais alegre.

O contrário se dá em caso de desasseio. É funesta a influência que sobre a família exercem a sujeira e a desordem de uma casa. As idéias, os sentimentos, os costumes ficam num nível baixo.

Por isso, leitora, teu princípio rezará: asseio, custe o que custar. Não temas a luta com o marido e com os filhos para obrigá-los a amar e praticar o asseio. Roupas, sapatos, móveis, utensílios de cozinha, escadas, varandas, hall, jardim, quartos, salas - tudo terá o brilho da limpeza.

O cansaço imposto para manteres o asseio, em tudo e em todos, é um cansaço por Deus. É um mérito que adquires como educadora. Além disso, esse trabalho te prenderá à casa, livrando-te do ciganismo das ruas e lojas.

Não basta o asseio que prende o marido na família, principalmente se ele é operário e passa o dia em lugares cheios de desordem e desasseio. Realizarás ainda aquilo que o verso canta:

Dentro, rendas, cristais, flores...
Em cada canto, a mão da mulher amada e bela
punha um riso de graça...!

Arte e bom gosto não reclamam luxo e despesas. Dependem apenas de um gosto formado e do cuidado em aproveitar os recursos que estão ao alcance mais ou menos de todos. Há palácios onde sobejam decorações e cortinas, mas de onde a arte ugiu. E há moradas, singelamente enfeitadas, que são um sorriso acolhedor.

Em todo homem, mesmo na criança ... existe certo amor ao belo. É um amor utilíssimo, porque inspira o progresso e a perfeição. É igualmente nobre, porque engrandece o homem, espiritualiza-lhe os pensamentos e sentimentos...

O talento artístico é poderoso recurso para encantar o marido. Um lar sem arte, sem culto ao belo, é ensombrado demais, com ares de prisão. Imagine-se a leitora uma sala cujas paredes e janelas nada representassem, quebrando a monotonia das linhas! Nem um quadro, nem uma cortina! Sobre a mesa, sobre a escrivaninha, nada! Nem um vaso dentro do qual fanasse uma flor!

Digamos logo que semelhante nudez interior não é conseqüência forçada de pobreza material. Pois até os pobres podem ter lá um ou outro quadro, herdado dos antepassados. Tudo isso é antes uma pobreza moral.

Mostra espíritos muito materializados, ou é o castigo do vício que corrompe as inteligências e embota os corações. Tira à primeira as intuições e ao segundo as emoções artísticas.

Portanto, leitora, ama e cultiva a arte de enfeitar, de colocar um quadro, uma cortina, uma flor. Se podes, ama a música e o canto. Há um rádio em tua casa? Não o ligues para as modinhas e sambas, cuja trivialidade musical só é vencida pelo duvidoso ou escandaloso sentido de seus textos.

Ama a arte e saber fazer-lhe uma critica amável - eis aí teu dever! Crítica amável: porque não deves reprovar sem mais nem menos as preferências do marido, a estátua e o quadro, o compositor e o poeta que ele escolhe.

Triste coisa é ver-se numa família católica alguma pintura imoral. Sobre o piano a estatueta nua e berrante provocação de pensamentos impuros. Isso nunca admitirás, leitora! Mesmo que seja preciso armar uma briguinha com o marido! Tanto as visitas como os filhos se escandalizarão no caso.

Neste ponto muitas donas de casa são bem pouco escrupulosas. Faço votos que estas linhas lhes queimem a alma com vivo remorso.

O verdadeiro belo coincide sempre com o verdadeiro bom. O que não pode ser bom para a pureza da alma, não é, por conseguinte, verdadeiramente belo.

Enorme, inegavelmente, é a influência do belo na formação das crianças. Sob as irradiações do bom gosto artístico gravam-se na alma infantil recordações que não morrem. Isso para o futuro. E agora, no presente, vivem as crianças gostando da casa, para ela voltando alegremente.

Gravuras e decorações apreciadas na infância dificilmente se apagam na memória do adulto. Boas ou más, ficaram e ficam registradas. Lembro-me ainda da profunda impressão causada em minha alma de menino por uma quadro religioso, no qual se mostrava o contraste entre a morte do justo e a do pecador. Estou vendo ainda as quatro pinturas, da sala de visita, olhando-me com um quê de elegância e fineza. Sei que, ao vê-las, parava de falar e pisava mansinho.

Não é, por conseguinte, pequena a responsabilidade de uma dona de casa, na escolha das suas "preferências artísticas". Preferível lhe seja deixar sem nada uma parede, do que "estragá-la" com algum quadro de mau gosto artístico. Antes faltar alguma coisa sobre a mesa, do que faltar a pureza na alma dos filhos, por causa de estátuas imorais.

Agradável pelo asseio e pela arte; quente e acolhedor pelo teu devotamento; confortável pela ordem e trabalho - farás de teu lar uma - atração e uma saudade.

Será ele amável moldura para tua fisionomia, recordada com amor pelo marido e pelos filhos. Se o deixares pela morte, todos sentirão que és insubstituível.

(Excertos do livro: As três chamas do lar - Pe. Geraldo Pires de Souza)

PS: Grifos meus

São Paulo da Cruz - Nosso novo padroeiro

São Paulo da Cruz
Nosso novo padroeiro


A Paixão de Jesus o transforma

Supera de muito as nossas débeis forças o que nos resta dizer a respeito de São Paulo da Cruz. Para cantar as maravilhas que iremos referir neste capitulo, fora necessário a lira do Anjo e o coração do Serafim. Balbuciaremos apenas algumas palavras.

Ó Jesus Crucificado, que de portentos não operais com vossos santos! Paulo foi sempre serafim de amor. Com o transcorrer dos anos essas labaredas cresceram tanto, a ponto de transformar-se em verdadeiro incêndio. Ao meditar os padecimentos do Redentor, abismava-se o santo naquele oceano sem praias nem fundo.

Flexas de amor transpassavam-lhe o coração e ele chorava copiosamente. Os colóquios com Jesus Crucificado comoveriam corações de pedra. Ouçamo-lo:

Ó meu amado Redentor, que se passava no vosso Coração divino durante a flagelação?!
- Ou: “Oh! que aflição, que agonia vos causavam os nossos pecados, as minhas ingratidões!... Por que não morro também por vós? ” .

Chamava-o de “ Meu Soberano Bem, O Celeste Esposo de minha alma..."”

Em suma, a dor e o amor encontravam expressões que, para traduzi-las, fora mister dar às palavras asas de fogo. E das expressões nasciam os desejos: sofrer e morrer pelo Amor Crucificado. Essas aspirações levavam-no aos delíquios da embriaguez espiritual e do êxtase.

Ao refletir:

Um Deus açoitado!... um Deus crucificado!... um Deus morto por meu amor!... ” , quedavam-se-lhe todas as potências da alma; o espírito já não formulava nenhum pensamento; somente o coração se absorvia no silêncio interior, suprema expressão da caridade.

Jesus, então, o atraía, comunicava-lhe de maneira inefável as próprias dores, fazia-o desfalecer de altíssima suavidade, submergindo-o no âmago do seu divino Coração. Duravam pouco essas operações da graça: os frutos, porém, como sejam, amor mais ardente a Jesus Crucificado e fome insaciável de padecer, perduravam por largo tempo.

Nas desolações espirituais, não pedia lenitivo: ao contrário, temia privar-se desses ricos tesouros. O frio, o calor, a fome, a sede, todos os incômodos físico. Eram-lhe doces refrigérios. Suportava-os com imensa alegria, chamando-os

Penhores do amor divino, pedras preciosas para o seu coração ” .

... Certo dia, com Jesus Eucarístico no coração, foi arrebatado em sublime êxtase. Abismado no Soberano Bem, prelibou por instantes os inefáveis encantos do amor e, associado à Humanidade do Verbo, teve sensível conhecimento da Divindade...

Compreendeu, além do mais, ser Jesus Crucificado a porta soberana do amor, a transformação da alma em Deus e o aniquilamento no Infinito.

Por esta porta é que devemos entrar, - diz santa Teresa - se quisermos que a divina Majestade nos revele grandes segredos ” (Autobiografia da santa, cap. XXVII). Intuíu outrossim como a alma, do puro amor de Deus, desce novamente, se assim nos podemos exprimir, a Jesus Crucificado. Penetrou tanto este segredo, chegando a enunciá-lo com linguagem divina:

A alma abismada toda no puro amor, sem imagens, em fé pura e simples, permitindo-o Deus, vê-se de repente submersa no das dores do Salvador e, num só relance da fé, contempla-os todos sem operação do entendimento, por ser a Paixão de Jesus Cristo obra exclusiva do amor. A alma perdida por completo em Deus, que é caridade, que é amor, transforma-se num inefável amálgama de amor e de dor. O espirito penetra-se de ambos esses sentimentos, vendo-se submerso no amor doloroso e na dor amorosa... ”

As chamas de amor reverberavam-se-lhe no rosto, no corpo tudo, chamuscando-lhe a túnica na parte que tocava o coração. Se tais eram as chamas desse amor, qual lhe não seria a impetuosidade?

Sentia contínuas e dolorosas palpitações de coração, sobretudo às sextas-feiras: indizível martírio que o fazia prorromper em furtivas lágrimas e gemidos, sempre solícito em ocultar os dons celestesO coração, pelas violentas palpitações, não se conteve nos estreitos limites do peito, dilatando duas costelas; fenômeno que não se pode explicar naturalmente, na opinião do sábio médico Del Bene, que o observara no retiro de Vetralla, quando tratou o nosso santo.

Aliás, outras testemunhas do fato prodigioso atestaram-no com juramento no processo de Canonização. Paulo sempre passou a noite de quinta para sexta-feira santa de joelhos, imóvel, ante o ss. Sacramento exposto, a meditar os padecimentos e a morte ignominiosa do Salvador. Numa dessas noites, enquanto desabafava o amor em torrente de lágrimas, Jesus gravou-lhe no coração o EMBLEMA sagrado, semelhante ao que trazia sobre o peito, com os instrumentos da Paixão e as dores de Maria. A partir desse momento, intumesceu-se-lhe o peito, dilatando extraordinariamente a cavidade que encerra o coração.

Afirma o dr. Giuliani com juramento que não só viu, mas tocou as três costelas prodigiosamente arcadas, não tenda a menor dúvida da sobrenaturalidade do fato.

(Excertos do livro - A vida de São Paulo da Cruz - Pe. Luis Teresa de Jesus Agonizante)

PS: Grifos nossos

Domingo de Ramos - Glória, laus.

Domingo de Ramos

Israël es tu Rex,
Davídis et ínclyta proles:
Nómine qui in Dómini, Rex benedícte, venis.
Glória, laus.


Vós sois o Rei de Israel,
ilustre descendente de David,
Rei bendito, que vindes em nome do Senhor.
Glória, louvor.

Quando a multidão, ao chegar ao cume do monte descobriu as brancas muralhas da cidade santa com os seus palácios magníficos e o seu vasto templo rodeado de muros de defesa, lançou aos ecos todos do vale os seus gritos de fé e amor: "Hosana! Hosana no mais alto dos Céus! Glória ao Filho de David! Bendito seja o que vem em nome do Senhor, para levantar o reino de David nosso pai!"

Não se podia reconhecer mais formalmente o Messias prometido a Abraão e cantado pelos profetas. E por isso os fariseus invejosos, que se tinham infiltrado no cortejo, exprobravam a Jesus os gritos, a seu ver sediciosos, dos seus partidários. Aquela ovação, feita ao seu inimigo, taxavam-na eles de provocação à revolta contra César. "Mestre, nós vos intimamos, diziam eles, com um despeito que não podiam dissimular, mandai já calar os vossos discípulos! - É inútil, respondeu o Salvador; porque, neste momento, se eles calassem, as próprias pedras clamariam."

Naquela hora, por Deus escolhida para glorificar o Seu Filho em nome da nação judaica, ninguém podia obstar aquela pública manifestação de Sua realeza.

Ai dos que, naquele dia soleme, recusaram abrir os olhos à luz, e blasfemaram contra o Salvador, em vez de cantar com o povo um hino á Sua glória! Do cimo do monte das Oliveiras, pousou Jesus, por um momento a vista sobre aquela Jesuralém que desde há tanto tempo vinha desprezando obstinadamente a graça da salvação, e chorou.

"Ó Jerusalém, exclamou Ele, se quisesses abrir os olhos e reconhecer Aquele, que só, e mais ninguém, te pode dar a paz! Porém não: estás ferida duma cegueira que te há de causar a ruína. Eis vem o dia, em que teus inimigos te rodearão de trincheiras e te encerrarão e apertarão por todas as partes. Eles te destruirão, e esmagarão contra o solo os filhos que encontrarem em teu seio; e de Jerusalém não ficará pedra sobre pedra, porque não conhecestes o tempo em que o Senhor te visitou."

Alguns momentos depois, entrava Jesus na cidade seguido da imensa multidão dos seus discípulos. E toda a população Lhe saiu ao encontro numa agitação profunda. Os estrangeiros perguntavam aos que encontravam: "Que homem é este, e porque tantas aclamações? - É o profeta de Nazaré, respondia-lhes a gente; este foi quem ressuscitou a Lázaro." É o "hosana ao Filho de David" ia ecoando de grupo em grupo, através de toda a cidade.

Quanto os fariseus, mais que nunca exasperados, diziam uns para os outros: "Já vedes que não aproveitamos nada: nós condenamo-lo e eis que toda a gente corre em seu seguimento."

Os discípulos acompanharam Jesus até ao templo; mas Ele só lá se demorou um momento; contudo foi o suficiente para ver que a casa de Deus voltara a ser uma feira pública, tal como de antes. Aproximama-se a noite; e Ele saiu com a deliberação de no dia seguinte por cobro àquelas profanações; depois, tendo despedido as turbas, voltou para o monte das Oliveiras, onde pernoitou, orando a Seu Pai.

(Excertos do livro: Jesus Cristo, Sua vida, Sua paixão, Seu triunfo - R. Pe. Berthe)

PS: Grifos meus

sábado, 27 de março de 2010

A IRA - Um dos sete gatos-pingados do caráter

A IRA
Um dos sete gatos-pingados do caráter


A ira é o violento desejo de castigar os outros. Não falamos aqui da justa ira, que foi, por exemplo, a de Nosso Senhor, quando do Templo expulsou compradores e vendilhões, mas da ira que se manifesta pela exaltação, pelo ódio, pelos acessos de furor, pela vingança, pelos gestos de ameaça.

Aos olhos do egotista, a ira mais não é do que o desejo de pagar a outrem na mesma moeda.

Na imprensa e na tribuna, a ira é chamada "justa indignação". Com esse qualificativo, nem por isso deixa de ser o defeito mercê do qual os espíritos perdem o sentimento da justa medida, o gosto da calúnia, e de atiçar discórdias.

A ira é habitual nas más consciências. Acusado de roubo, oculpado indigna-se com muita mais violência do que o inocente; a esposa infiel enfurece-se no caso de a sua falta ser descoberta; as donas de casa ciumentas e rancorosas "aliviam-se", "descarregando" sobre os criados.

Os egotistas dessa espécie repelem com truculência todos aqueles que lhes desagradam, e maldosamente caluniam aqueles cuja virtude os condena.

A ira comporta vários graus. No primeiro desses graus, manifesta-se através de uma irritabilidade e impaciência exageradas, em presença da mais pequena contrariedade. Se o café não está quente ao pequeno almoço, se o jornal chegou atrasado, logo o ego faz barulho e resmunga.

No segundo grau, a ira ganha aspectos de tempestuosa: a pessoa gesticula, ferve-lhe o sangue nas veias, ruboriza-se, os objetos voam à sua frente, - o que tudo prova que o ego não admite qualquer contrariedade na satisfação dos seus desejos.

A ira atinge o seu terceiro grau quando passa a vias de fato, quando o ódio procura "desforrar-se", quer causando prejuízo a outrem, quer, mesmo, desejando-lhe a ... morte! Muitas são as pessoas que, antes do despertar súbito do ego, ignoram as diabólicas reservas de cólera que nelas existem, latentes.

A ira prejudica o desenvolvimento da personalidade e susta todo o progresso espiritual, não só por perturbar o equilíbrio mental e falsear a capacidade de julgar, mas também por se colocar ante os direitos doutrem, e ainda por destruir o espírito de recolhimento, indispensável para podermos seguir as inspirações da graça.

A ira relaciona-se invariavelmente com alguma decepção do ego. É mal muito difícil de curar, por ter suas raízes no amor-próprio, sua verdadeira causa, ainda que poucas pessoas queiram convir nesta explicação. Um desastre corporal ser-nos-ia, em muitos casos, menos penoso do que a humilhação resultante de termos que confessar que o nosso amor-próprio é a causa dos nossos acessos e... excessos de ira.

(Excertos do livro: Elevai os vossos corações - Arcebispo Fulton F.Sheen)

PS: Grifos meus
Ver também:

Família numerosa

Conferência XIV - Dom Tihamér Tóth
Família numerosa


"Tantos botões em vossas roseiras, tantas pérolas para vossas coroas!"

... A Igreja de Cristo, com grande coragem, levantou a voz em favor do filho; hoje ainda, ela exige a inviolabilidade dos direitos do filho que ainda não nasceu; mas não se esquece dos sacrifícios imensos que custam aos pais a existência e a educação de vários filhos.

É justamente porque a nossa santa Religião sabe bem o que significa, em nossos dias, educar uma família de cinco ou seis filhos, que ela rodeia de grande respeito os pais heróicos que fazem a Deus este sacrifício, mas ela nunca pode permitir que se tenha o direito de agir de modo contrário ás leis divinas, e que se tenha o direito de impedir a vinda do filho por meio de intervenções criminosas.

Agora examinemos mais de perto as dificuldades invocadas por certos esposos para afastar o filho. Elas não são insolúveis para as almas generosas e realmente cristãs, de modo que o homem não contrarie as leis de Deus.

*Antes porém de examinar sucessivamente às objeções formuladas contra a presença do filho, quereria fazer uma advertência preliminar.

Quando a religião faz um juízo muito severo contra os esposos que tornam estéril sua vida conjugal por meio culpáveis, ela não repreende, em momento algum, os esposos que não cometeram falta alguma neste ponto e que aceitariam, com bastante alegria, os filhos, mas aos quais Deus privou desta alegria. Ela estaria longe de repreendê-los por um estado de coisas do qual não são responsáveis.

Pois há bastante tristeza em sua alma; eles sentem bem que lhes falta alguma coisa de essencial para a sua felicidade.

Não os repreendo, quero antes inspirar-lhes alguns pensamentos consoladores, e indicar-lhes até um meio de aproveitarem esta situação.

- O traço essencial da alma cristã é a convicção de que tudo o que Deus faz ou tudo o que Ele permite, Ele o faz ou permite segundo um plano. Se Ele não dá filhos a estes esposos, apesar de suas fervorosas orações, é que há nisto uma intenção particular.

Qual a intenção? Talvez a de lhe fazer consagrar mais suas forças a alguma grande causa religiosa, ou ao bem comum, ou ao serviço desinteressado do próximo. Ou talvez Deus o permita a fim de que haja pessoas sem filhos que cuidem de pequeninos órfãos ou de crianças pobres e infelizes. Quantas crianças na miséria sobre a terra! Assim houvesse muita gente para ajudá-los...

Tudo isto, porém, não é senão uma digressão; deste assunto não falaremos mais nesta palestra.*

Por que não querem filhos?

Qual é esta palavra de ordem? Quais os pretextos invocados, muitas vezes, por esposos receosos de filhos? Olhemo-los frente a frente.

Razões financeiras

A objeção mais freqüente é a situação econômica difícil.

"Amamos os filhos, mas não temos com que sustentá-los. Um filho é o suficiente, não podemos ter mais". Quantas vezes não se ouvem estas frases, embora sob formas diversas.

Mas se observarmos mais de perto os que assim se lamentam, e como vivem os que não podem ter filhos, chegaremos certamente a uma constatação muito curiosa. É que na maior parte dos casos a causa do receio de ter filhos não é a miséria, mas, pelo contrário, é o bem-estar. Por incrível que pareça, no entanto, é assim.

Examinemos a história desta doença: Donde vem essa epidemia que arruína a vida da família. Foi entre as famílias dos operários ou camponeses que começou esta moda de não ter senão um filho, ou mesmo nenhum? Começou ela entre as famílias que, pela sua pobreza, tinham o direito de temer não possuir bastante pão para tantas bocas esfomeadas?

Certamente, não. Inegável que esta doença mortal para os povos apareceu em primeiro lugar entre as famílias abastadas, onde haveria pão suficiente a até bolo para os cinco ou seis filhos, entre as famílias onde a sede de prazeres e a licença dos esposos preferiram as comodidades e tranquilidade de uma existência sem filhos. Isto é infelizmente um fato inegável.

Não olhamos, contudo, só o passado; mas também o presente. Que vemos atualmente? Em geral esta objeção não é formulada por aqueles que ganhando pouco têm uma casa com um quarto e uma cozinha e vários filhos; mas, ao contrário, pretextam dificuldades econômicas os que, em um apartamento coberto de tapetes e ornado de quadros célebres, não têm senão um filho, mas possuem além disso uma empregada para tudo, uma cozinheira, uma governanta inglesa, dois ou três pequeninos cães bem ensinados e revestidos de belos casacos.

"Nossos meios não nos permitem mais filhos", dizem esses pais. São eles suficientes para os concertos e bailes, para as viagens e vesperais, para as temporadas na praia e modas, para os jantares e partidas de cartas, para os autos e cães. Mas não para os filhos.

Sinto que digo neste momento coisas amargas, mas olhai ao redor de vós. A maior parte das famílias não têm mais filhos, precisamente porque fazem mais despesas e vivem mais luxuosamente do que lhes permite a situação. O receio de ter filhos é mais forte, não aí onde se vive melhor mas sim onde os pais, indiferentes quanto à religião, não vêem no grande número de filhos, senão um encargo que reduziria sua liberdade e tornaria impossível o seu luxo.

Os esposos religiosos não deveriam pensar assim. Para os pais religiosos é sempre uma alegria, quando um filho nasce na família: uma alegria porque se recordam da maravilhosa promessa feita outrora por Nosso Senhor Jesus Cristo, e cuja melodia ressoa incessantemente a seus ouvidos, a cada hora difícil, a cada noite de insônia, a cada minuto de sacrifício: "Aquele que receber em meu nome um desses pequeninos, é a mim que recebe" (Mt. 18,5).

Existem para os pais promessas mais consoladoras e mais confortantes que a vinda de Nosso Senhor, cada vez que um novo filho nasce na família?

Não temais, pois, se tiverdes mais filhos. Não temais ficar por isso mais apertados. Porque o coração dos pais é como lareira ardente: quanto mais combustível aí se põe, mais ele arde. O coração daqueles que não tem filhos é frio. O primeiro filho acende a primeira chama e amor dos pais; cada novo filho aumenta-a, e mais anima.

Falando, porém, assim, parece-me ver entre este ou aquele dentre os que me ouvem (lêem) dizer:
"Vou escrever ao pregador, É fácil dizer do latar, da cátedra, porque ele não conhece a vida".

Não me escrevais, não. Eu a conheço. Sei mesmo que há realmente, por causa das miseráveis condições materiais de hoje, famílias que receiam com razão a vinda de um novo filho, porque não poderiam sustentá-lo.

Que lhes diremos nós? Que lhe diremos, quando em sua amargura, eles não sabem mais quase o que dizem?

O ponto de vista católico é duro e severo, dizem eles. Já não há tanta miséria na terra? Já não falta o pão aqueles que vicem? E eis o Cristianismo a proclamar que é um pecado defender-se contra os filhos. A Igreja não tem coração e nem indulgência!

Apresentai esta acusação em toda a severidade, para que vejais que a Igreja sabe de tudo isto. Como não teria ela compaixão de todos aqueles que, em o merecerem, estão na miséria? Como não haveria ela de saber que, infelizmente, famílias realmente religiosas, por causa dessas dificuldades, ficam em uma terrível alternativa?

Para evitar mal entendidos, declaremos claramente que a Igreja nunca teve a idéia de que os pais pudessem pôr no mundo sempre mais filhos, irresponsavelmente. Nada disto. Há famílias que podem educar, convenientemente, os dez filhos, há outras que não podem educar mais que um ou dois. A Igreja o vê bem, ela só não o permite que a limitação de números de filhos se realiza por intervenções culpáveis, manchando o santuário da família.

Quando por sérias razões a família não pode mais aceitar filhos, é preciso para que ela não os aceite mais, recorrer à castidade conjugal, e não a meios criminosos.

O homem moderno gosta de ouvir falar de tudo, menos de uma coisa: Não quer ouvir falar do domínio de si. O homem que aprendeu dominar as suas forças mais selvagens do mundo material, esqueceu de aprender a dominar a si mesmo, esqueceu e, se for preciso, negará que todas as grandes obras do passado, no terreno da civilização material ou da intelectual, são o fruto de renúncia.

Mas, enquanto que a santa Igreja exige sem reserva a pureza moral da vida do casado, ela não cessa de exigir também para as famílias condições que tornem possível a observação da castidade conjugal, pois se conhecemos que para muitas famílias na realidade é difícil observar as leis divinas por causa da situação econômica atual, não se segue que tenham agora o direito de mudar a lei de Deus; pelo contrário, é preciso transformar a situação econômica.

A lei divina é eterna e os homens não tem o direito de tocá-la. Mas as leis econômicas não são eternas. Elas dependem das transformações a que estão sujeitas as instituições da vida atual. Se o sol e o meu relógio não se combinam, eu não posso tocar no sol, mas somente no relógio.

Quem não vê a grandeza da tarefa que incumbe neste ponto à legislação? Com efeito, há hoje ainda homens que não têm família para sustentar, mas dissipam em uma só noite somas que bastariam para alimentar, durante a semana, várias famílias numerosas.

Enquanto a Igreja corajosamente levanta a voz em favor dos filhos, e assim defende com eficácia o interesse da nação, a legislação civil não tem o direito de olhar, com indiferença, a luta difícil em que ela se empenha em favor da criança, mas deve, por inúmeras medidas legais, por intervenções do domínio educativo, impostos fiscais, por abonos e outros meios materiais, favorecer as famílias numerosas.

Razões de saúde

Ao lado das preocupações materiais tem-se o costume de invocar razões de saúde para recusar ter novos filhos, "os filhos fazem envelhecer... tiram a força das mães... podem até custar-lhes a vida...!" Tais são os temores de alguns.

Cada vez, porém, que ouço falar dessas apreensões, cada vez que ouço falar de jovens que receiam ter filhos, "porque elas envelhecem", e "põem em perigo a saúde", recordo-me da resposta de um célebre médico francês. Uma senhora lamentava-se de diversos sintomas de doença. O médico contentou-se em perguntar-lhe:

- Senhora, quantos filhos tem?
- Três, respondeu a senhora.
- Pois bem, replicou o médico. Quando tiver cinco, desaparecerão por si mesmas todas estas enfermidades.

Pois é verdadeiramente maravilhosa, a força que há nos braços de um pequenino filho. Como ele une cada vez mais, dia a dia, o coração dos seus pais. Como os adultos se tornam novamente crianças sorridentes, quando cuidam de um filho! Com que palavra de ternura a mãe sabe falar a seu filhinho! Com que precaução, e orgulho, o pai leva nos braços robustos o seu filho.

E como o semblante desses dois adultos desaparece toda a preocupação! Como seus olhares se tornam doces! Como o sorriso há tanto tempo talvez desaparecido, reaparece em seu rosto, quando olham o filho!

Tal é a força rejuvenescedora do filho, protegendo o enfraquecimento precoce, a aspereza, o tédio da existência! Nos lares, porém, onde não brilha o sorriso da criança, a velhice cedo aparece, a alma dos esposos sem filhos é mais vítima da arterioesclerose que seu corpo.

Mas objetará talvez alguma jovem, eu não quero diversos filhos porque me envelhecem prematuramente.
Pois bem, que responderemos nós?

Vistes já, com certeza, nestas belas tarde de maio uma árvore toda florida banhada pelo brilho radiante do sol que se põe? É a imagem da noiva de pé ante o antar no dia de seu casamento.

Sim, é bela a jovem árvore florida.

Mas é ainda mais bela quando desaparecido o sinal de sua beleza exterior, quando caídas as suas flores, aparecem em seu lugar os pequeninos botões. E a árvore se alteia apesar dos ventos e das tempestades, arrasta o calor e o frio, bebe incansavelmente as águas da chuva e os raios do sol, para que um dia, chegado o seu outono, o tronco possa apresentar seus ramos cobertos de frutos.

Se todas as jovens, que se inquietam pela sua beleza, refletissem: é bela a árvore ornada de flores na primavera, mas esta beleza não tem finalidade, e nem significação se não houver frutos...

Vamos terminar esta instrução. Queria reforçar os princípios e os enunciados apresentados uma outra idéia inteiramente nova, que até aqui eu deixei de lado, mas quero lembrá-la terminando...

Monstruoso câncer das idéias mundanas e frívolas. É uma expressão forte?

Pode-se, porém, empregar uma outra expressão, quando se lê em uma carta de pessoas casadas:

"Desde o início concordamos em não ter filhos. Sem filhos é se mais livre. Somos jovens e queremos aproveitar a vida. Mais tarde pode-se pensar em um filho".

Estará morta toda a consciência destes jovens?
Se eles ignoram a responsabilidade que tem diante de Deus não sentem ao menos a falta que cometem contra a Pátria? Pois a nação não é só a planície e a montanha, a fábrica, os caminhões de ferro; a nação é um grande número de homens fortes e moralizados.

"Mais tarde pode-se pensar em um filho!"
É horroroso imaginar o tesouro que este terrível modo de pensar arrebata à nossa nação!...

Escutai agora as advertências de nossa Igreja.

... Que quer a Igreja de Cristo? Nada quer senão que cada um fale com santo respeito da mãe de família que espera o nascimento de um filho, e sobre cuja fronte brilha um raio de coroa da Bem-aventurada Virgem de Belém.

Que quer a Igreja de Cristo? Que cada um levante a voz contra estes esposos que gostam de educar gatos e cães do que filhos. Que quer a Igreja de Cristo? que cada esposo e cada esposa ouça estas palavras de Nosso Senhor: "Aquele que receber em meu nome um desses pequeninos, é a mim que recebe" (Mt. 18,5).

Que quer enfim a Igreja de Cristo? Quer que realize, sempre mais para mãe, a promessa de São Paulo, assegurando-lhes que cada vez que dão ao mundo um novo filho adquiriram muito para a vida eterna. Ou então, como se exprime um provérbio húngaro:

"Tantos botões, em tua roseira, outras tantas pérolas para tua coroa".
Compreendestes? Ouvistes, mães de família?

Eis a conclusão de hoje:
Tantos botões em vossas roseiras, tantas pérolas para vossas coroas! Amém.

(Excertos do livro: Casamento e família - Dom Tihamér Tóth)

* Houve um acréscimo no texto, onde o autor faz uma pequena divagação sobre os esposos não agraciados com filhos. (27/03/2010 - 20:43)
PS: grifos meus

ESPECIAL: Discursos do Papa Pio XII

Papa Pio XII


Como nos primeiros séculos do Cristianismo, assim nos tempos modernos, nos países do mundo, onde a perseguição religiosa aqui e ali se enfurece, abertas e sutis, mas não menos duras, os mais humildes fiéis podem de um momento para outro encontrar-se diante da dramática necessidade de escolher entre a própria fé, que tem o dever de conservar intacta, e a liberdade, os meios para sustentar a vida, a própria vida.

Mas também nas épocas normais, nas vicissitudes e nas condições ordinárias da família cristã, sucede de vez em quando que as almas se encontrem bruscamente colocadas na alternativa de violar um imprescindível dever ou de expor-se a sacrifícios e riscos dolorosos e duros, na saúde nos bens, na posição familiar e social, colocadas portanto na necessidade de ser e demonstrar-se heróicas, se querem permanecer fiéis às suas obrigações e permanecer na graça de Deus.

Quando os nossos predecessores de veneranda memória e particularmente o Sumo Pontífice Pio XI na Carta Encíclica "Casti connubii", chamaram a atenção e recordaram as santas e inamovíveis leis da vida matrimonial, ponderavam e tinham perfeitamente consciência de que em não poucos casos, aos esposos cristãos pede-se um verdadeiro heroísmo para observar inviolavelmente as suas leis.

Trata-se de respeitar os fins do matrimônio desejados por Deus; ou de resistir aos incentivos ardentes e lisonjeiros das paixões e de solicitações, que a um coração inquieto insinuam que vá procurar fora o que, na legítima união não encontram ou crêem não ter encontrado tão plenamente como haviam esperado; ou que, para não quebrar ou diminuir o vínculo das almas, e do mútuo amor, sobrevenha a hora de saber perdoar, de esquecer um litígio, uma ofensa, um aborrecimento, talvez grave; atrás do véu da vida cotidiana!

Quantos heróicos sacrifícios escondidos!
Quantas angústias do espírito para conviver e manter-se cristãmente constante no próprio dever e no próprio cargo!

E esta mesma vida cotidiana, qual força de alma não pede muitas vezes: quando toda manhã se deve voltar aos mesmos trabalhos em sua monotonia; quando é melhor suportar com sorriso nos lábios, amavelmente, alegremente os defeitos recíprocos, os jamais vencidos contrastes, as pequenas divergências de gosto, de hábitos, de idéias, que a vida em comum traz, quando, em meio de mínimas dificuldades e incidentes, muitas vezes inevitáveis, não deve perturbar-se e diminuir a calma e o bom-humor; quando, em um encontro frio, é urgente saber calar, parar a tempo o lamento, mudar e adoçar a palavra que, lançada fora, daria desafogo aos nervos irritados, mas difundiria uma nuvem opaca na atmosfera das paredes domésticas!

Mil particulares ínfimos, mil fugazes momentos da vida cotidiana, cada qual deles é bem pouca coisa, é quase um nada, mas que a continuidade e o adicionar-se terminam tornando tão pesados, e pelos quais, entretanto, por uma tão considerável parte é entrelaçada e concatenada, no mútuo sofrimento, a paz e a alegria de um lar.

Não procureis em outros lugares a fonte de tais heroísmos.

Nas dificuldades da vida familiar, como em todas as circunstâncias da vida humana, o heroísmo tem sua raiz essencial no sentimento profundo e dominador do dever, daquele dever, com o qual não é possível transigir ou pactuar, que deve prevalecer em tudo e sobre todos; sentimento do dever, que para o cristão é consciência e reconhecimento do domínio soberano de Deus sobre nós, de Sua soberana autoridade, de Sua soberana bondade; sentimento que além de tudo nos faz compreender que a vontade divina é a voz de um infinito amor para conosco; sentimento, em uma palavra, não de um dever abstrato ou de uma lei prepotente e inexorável, hostil e esmagadora da liberdade humana, do dever e do agir, mas que corresponde e se inclina ás exigências de um amor, de uma amizade infinitamente generosa, transcendente e que rege as multiformes vicissitudes do nosso viver aqui embaixo.

(Discurso aos esposos - 2 de agosto de 1941 - Papa Pio XII)

PS: Grifos meus.

quinta-feira, 25 de março de 2010

A dor vivifica e engrandece a alma.

A dor vivifica e engrandece a alma.


"...não tinha presença nem beleza
 para atrair nossos olhares,
nem aspecto que nos cativasse.
Desprezado e evitado pela gente,
homem acostumado a sofrer,
curtido na dor;
ao vê-Lo cobriam o rosto;
desprezado, nós O tivemos por nada..."
(Isaías 53, 2b-3) 


Disse um poeta:
Tu fais l'homme, ó douleur!
Fazes o homem, ó dor!

E outro poeta, seu irmão pelo gênio, acrescentou:
Rien ne nous fait si grands qu'une grande douleur.
Como uma grande dor, nada nos faz tão grandes.

Entrevejo, uma terceira e mais alta razão da dor. Ela não é somente uma luz no meio das obscuridades e das ilusões da vida, nem um remédio para as suas corrupções; ela vivifica e engrandece as almas; eu quase não hesitaria em dizer que ela as cria de novo. Pelo menos, incute nelas uma beleza, uma grandeza comovedora que a própria virtude não lhes poderia dizer.

A verdade é que, nesta triste terra, nunca houve uma grande obra nem uma grande alma sem a dor. Para ser grande, o gênio, a glória e a virtude jamais bastaram. A dor foi sempre necessária.

Em vão um homem reuniu sobre a sua cabeça todas as coisas; a humanidade fitou nele o olhar, mas para saudar a sua grandeza esperou que ele tivesse recebido o batismo da dor. A própria virtude, a virtude feliz, não tem sido o maior espetáculo contemplado pela terra. Foi sempre imprescindível que a dor viesse comtemplá-la, dando-lhe um indizível e incomparável aspecto, como se, nessa augusta oficina em que se formam as almas, o gênio, a glória, a virtude só pudessem fazer o esboço; os ultimos traços, aqueles que o Mestre reserva para Si, são dados pela dor.

Porque? É um mistério, diz-se. Sim; mas o mistério não é, talvez, impenetrável.

Nós somos pequenos, porque somos limitados. E quanto mais voluntariamente aceitamos esses limites, quanto mais nos encerramos neles, tanto menores somos. Para sermos grandes, devemos sair dessas estreitas raias; cumpre que, com um supremo esforço, nos libertemos desse miserável círculo.

As crianças indianas traçam em torno de um inseto que elas julgam perigoso, um círculo de carvões cardentes. Recuando, diante da dor, depois de ter em vão tentado transpôr o obstáculo, o inseto se contrai e morre. É a isto que as almas vulgares se resignam: mas as grandes almas saltam fora do círculo, passando através do fogo.

Vêde o escritor. Quando escreve ele sublimes pensamentos? É, por acaso, num período de ociosidade ou quando permanece nos limites aparentes da sua natureza? Não é antes quando os transpõe, por um esforço doloroso?

"Termino esta obra austera no silêncio de um trabalho de dezessete noites. E agora que ela se acha finda, eu, trêmulo ainda dos sofrimentos que me causou, em um recolhimento tão santo como a prece, pergunto a mim mesmo se a minha voz será ouvida." Eis como nascem dolorosamente as grandes obras.

E o poeta? Onde acha ele os seus versos imortais? Quem ignora que a alma canta melhor amargurada pela dor do que repleta de jubilo?

Et chacune de ses blessures
Lui donne un plus sublime accord

E cada ferida sua.
Lhe ajunta um sublime acorde.

Diz um poeta. E quanto mais amarga é a dor, tanto mais penetrante é o grito.

Les chants désespérés sont les chants les plus beaux,
Etj'en sais d'immortels qui sont de purs sanglots.

Com a voz do desespero os cantos são mais belos,
há cantos imortais que são puros soluços.

O mesmo se dá com os grandes caracteres, com as almas profundas e com os corações bons. A dor lhes é necessária. Para aqueles que não sofreram, o arado da vida não sulcou mais do que a superfície da alma. Os seus sentimentos não têm intensidade, como ao seu coração falta a ternura e ao seu espírito faltam horizontes.

Tudo neles é artificial, como é vulgar o espírito e é banal a bondade.

Em suma, sob todos os pontos de vista, só a dor penetra assaz profundamente na alma para a engrandecer. Há em nós pontos muito elevados em que dorme a vida, profundidades ocultas em que jazem tesouros e que a energia da alma não poderia atingir. É necessário o golpe fulminante da dor. E eu ouso dizer que há lugares do coração que são totalmente obscuros, e onde a dor precisa de penetrar para que eles se iluminem.

... Do mesmo modo que só batida a pedra produz a centelha, assim também cumpre ferir a alma para que dela se desprenda a luz, a grandeza, o heroísmo, a dedicação e mil tesouros ocultos. A estátua está no mármore; dali é preciso destacá-la. A esmeralda está no fundo desse bloco de quartzo; para que cintile, cumpre tirar o manto de pedra que a esconde.

E para isso empregamos o martelo e o cinzel. O homem procura extrair da sua alma as belezas que ela encerra; mas como raramente tem a coragem de empregar os meios exigidos por esse trabalho, Deus o auxilia nessa tarefa, enviando-lhe a dor.

E é por isso que todos os santos, os gênios, todas as grandes almas têm sido os filhos previlegiados da dor. A coroa de louros jamais se ostentou em frontes que não estivessem sulcadas pela amargura...

Que diremos dos soldados, dos heróis?
É a dor que faz o soldado.

A alma nunca se revela melhor, em uma beleza mais comovedora e verdadeira, do que perante a morte, nessas horas solemes em que o perigo lhe apresenta uma tão completa abdicação de si mesma. Esquecer-se de si e dedicar-se até a morte, eis o papel do soldado. É a beleza suprema, e outra não há semelhante a essa. Vêdes bem que o homem só pode ser verdadeiramente sublime diante da dor e da morte.

Por isso, nada existe de mais sublime do que os santos. Não é somente uma vez, por acaso, no campo de batalha que a dor os eletriza e os impele aos atos de heroísmo; por sua própria vontade e pela de Deus, eles vivem na dor. E ela os arranca incessantemente dos limites do mundo e da personalidade.

Essa vida de sacrifícios que eles voluntariamente procuram, brilha nas profundezas das suas almas como um holocausto. É o mais belo espetáculo que a terra pode oferecer aos céus.

"Não sabeis, escrevia São Francisco de Sales, em que despertamos a inveja dos anjos: é no que podemos sofrer por Deus, por amor do qual eles jamais sofreram." Que podem eles oferecer a Deus e áqueles a quem amam? Votos? Homenagem? Nós também; e, ainda mais, as nossas dores livremente aceitas e amorosamente oferecidas.

E não são apenas os anjos que invejam essa grandeza e essa beleza da nossa alma. No seio da glória, Deus permanece em admiração perante o que o homem faz no seio da dor. Deus lhe invejou essa faculdade sublime de sofrer e morrer por amor. E parece que se Deus não houvesse achado o meio de morrer pelo homem, que por ele sofria e morria, a criatura teria tido um gênero de grandiosa beleza que faltaria ao Criador.

Eis porque um dia os céus se abriram, e o Filho de Deus morreu na Cruz, em uma dor infinita, a fim de que, fossem quaisquer os sacrifícios do homem, ele visse sempre o seu Deus na glória de uma imolação superior á sua.

Assim, a grandeza e a beleza das almas são graduadas de conformidade com a dor. Imaginai uma pirâmide, no alto da qual estão aqueles que têm na fronte a centelha do gênio, da virtude e da dor, e á frente deles Aquele que, sob esse triplice aspecto, se chama o primogenito dos filhos dos homens. Mas embaixo, as dores menos intensas e também os sentimentos menos profundos, as vidas mais vulgares.

Á medida que se desce, aumenta o riso; á medida que se sobe, vê-se reinar a seriedade, sentimento inseparável dos grandes atos da vida; e com a seriedade a verdadeira beleza, essa beleza comovedora e grave da virtude, do amor e da dor, cujo encanto é inefável.

A dor é uma coisa tão insigne que dá realce á própria beleza.
O rosto, do mesmo modo que o coração, se embelece com o sofrimento.

(Excertos do livro: A Dor - Monsenhor Bougaud)

PS: Grifos meus