quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

A tática do combate (Vida espiritual)


A tática do Combate

Hi in curribus et hi in equis: nos autem in nomine Domini Dei nostri invocabimus (Sl 19,8).
Uns confiam em seus carros, outros em seus cavalos; quanto a nós, apoiamo-nos no nome do Nosso Deus que invocamos.

Se o trabalho da perfeição é uma luta, há, pois, uma estratégia a adotar, uma tática a seguir. Nos combates humanos, triunfa aquele que tem fé em si. O grande recurso do general é manter no coração do soldado a confiança no seu próprio valor.

No combate com o divino amor, o guerreiro mais terrível é a criancinha que nenhuma confiança tem em si mesma, e tudo espera de Jesus que com ela combate. Entretém incessantemente em tua alma a desconfiança absoluta em ti mesma e exalta cada vez mais tua confiança em Deus, e vencerás.

O pais do divino amor é situado além das fronteiras humanas. A nenhum homem é dado pretender sequer, com suas próprias forças, fazer ainda que um passo no caminho que para lá conduz.

O natural e o sobrenatural aproximam-se, entrelaçam-se tão bem, que a alma se engana muitas vezes. Ela atribui a si um papel que pertence exclusivamente à graça. Jesus insinuou-Se de tal modo em seu ser que não raro ela julga andar só, quando é levada em Seus divinos braços.

Deves persuadir-se de que a fraqueza da natureza humana, mesmo corrigida, sustentada e enobrecida pela graça, é sem limites. Tua vontade é a tal ponto volúvel que, sem um socorro gratuito de Deus, apesar de todas as graças passadas, és capaz de cometer o pecado mortal mais abominável e renegar a Jesus que tanto amaste até hoje.

Não percas jamais de vista esta verdade fundamental.

E o que ainda é mais assustador nessa fraqueza radical é que a alma nem por isso se assusta. Ao contrário, ela alimenta em si mesma uma secreta presunção que lhe faz dizer: Jamais cairei!

Essa presunção é, talvez, o único obstáculo sério na vida espiritual. É tão fortemente arraigada em certas almas que, após muitos anos, ainda persiste. Para arrancá-la, Deus, na sua misericórdia, permite numerosas quedas, algumas vezes mesmo pesadas, para que, enfim, a alma decubra o horrível cancro que a consome.

Oh! como é preciso rogar a Deus que nos faça conhecer a nossa fraqueza sem nos deixar cair no precipício.

A alma não chega à completa desconfiança de si mesma senão gradativamente. A princípio, consegue, com a experiência repetida de sua fraqueza, não se admira mais de suas faltas. Para transpor esse primeiro passo, é preciso, para certas almas, bem longos anos, tão boas elas se julgam.

Em seguida, a poder de graças especiais, a alma consegue não somente não mais se admirar, mas mesmo não se despeitar das suas incessantes recaídas. Ela volta a Jesus, depois de cada falta, com a mesma confiança filial, exprime-Lhe o seu pesar, renova-Lhe sua resolução e abraça-O, sem suspeitar que Jesus possa lembrar-Se de sua infidelidade.

Enfim, chegada ao fundo desse abismo, não somente ela não se admira e nem se despeita mais de suas culpas, mas experimenta uma alegria real em sentir-se tão pequena e tão fraca diante de um Deus tão poderoso. Cada uma de suas fraquezas dá ensejo a um ardente ato de amor e de confiança inabalável na bondade de Deus.

Assim, no fundo de seu nada, a alma encontra o máximo da confiança de Deus.

O verdadeiro, o único fundamento desta confiança é, pois Deus só, Deus que é infinitamente bom, poderoso e fiel em Suas promessas. De um lado, nada podemos na ordem sobrenatural, pois que um abismo intransponível a separa da natureza humana. Por outro, Deus exige que sejamos perfeitos, que sejamos santos e imaculados em sua presença.

É claro, pois, que Ele nos dará o necessário para cumprirmos sua vontade.

E não somente Ele nos dará, mas deve dar, pois, sem isso, seria exigir o fim sem os meios. Essa obrigação, Deus impôs-Se a Si mesmo. Chegou até a dar no Evangelho Sua palavra de honra, que Ele a contratava e que Sua promessa seria infalível. Ele nos pede para não duvidar nem de Sua palavra nem de Sua bondade.

Além disso, Ele quer que se saiba que não faz depender a eficácia da oração do mérito daquele que ora, mas tão somente da força intrínseca da divina promessa. Quanto mais miseráveis somos tanto mais o auxílio de Deus deve seguir pronta e plenamente nosso grito de angústia.

Para que esta bondade de Deus te cause mais forte impressão, lembra-te do quanto Deus fez por ti no passado, quando mesmo ainda não O procuravas ou, quem sabe, O evitavas.

Que não faria Ele hoje, quando O amas e buscas de todo o teu coração?

Lembra-te também que o único desejo do Salvador, Sua ocupação única de Redentor, é perdoar tuas faltas e conduzir-te à santidade, à qual aspiras. Toda a obra de Redenção, os imensos sacrifícios que Jesus Se impôs, Seu nascimento, Sua morte cruel, Sua vida eucarística, não tem outro fim senão preparar-te para receberes Seus dons, e agora que desejas recebê-los, agora que suplicas que te não repila, esse Jesus tão indulgente ocultar-Se-ia de ti?

Considera, além disso, que o divino Mestre tem todo o interesse em te conceder a santidade, pois és uma pequena parte Dele mesmo, és um membro do Corpo do qual Ele é a Cabeça.

Tua glória é a Sua, tua imperfeição é para Ele um desdouro.
Se Ele trabalha com essa paciência divina, arrancando-te de ti mesmo, é a fim de formar-te à Sua imagem, infundir em ti Sua vida e apresentar-te ao Seu divino Pai como um outro Cristo.

... Deixa essas verdades consoladoras penetrarem em tua inteligência e descerem no teu coração, e depois faze um ato de confiança heróica como jamais fizeste. Medita profundamente no abismo de teu nada, representa-te toda tua fealdade aos olhos de um Deus infinitamente puro, depois levanta a fronte com uma confiança e uma temeridade criança ...

Roga sem cessar a Jesus que conserve em teu coração o desejo da santidade, pede-Lhe que arranque todo o apoio em ti mesmo, e depois deixa que falem os sábios que se escandalizam de tua temeridade infantil.

... Deixa-te, pois, atrair por Jesus, não permitas ao temor ou à desconfiança perturbar teu coração. Afasta, incontinenti, todo pensamento inquietador, toda idéia deprimente, todo sentimento de tristeza ou de desânimo. Esses são os frutos da confiança em ti mesmo.

... Para avançar rapidamente no caminho da santidade, conta mais com  a paciência que com a precipitação. Esse caminho conduz do berço ao túmulo: É preciso caminhar sempre e sempre avançar. A precipitação não encurta a estrada a percorrer; ao contrário, ela provoca o cansaço e o desânimo. Está certo de chegar aquele que, após cada falta, se levantar calmamente e continua seu caminho.

Quanto mais a alma economiza suas forças modera seus ímpetos e contém seu ardor, tanto mais longe irá.
O apressado, ao contrário, esgota-se, enfraquece e tomba sem forças para continuar o caminho.
Confiou demais em si mesmo.

Tem, pois uma vontade sempre enérgica, jamais precipitada, um espírito sempre alerta, jamais preocupado, um coração sempre corajoso, jamais agitado.

Convence-te que, na vida espiritual, Deus leva mais em consideração a imensidade de teus desejos que a perfeição de tuas obras. Esmera-te em executar os bons desígnos, age como se tudo dependesse de ti unicamente e depois observa, sem despeito, que nada fizeste.

O homem não é realmente forte senão em desejos e Deus considera o desejo sincero como se fosse realizado.

Forma grandes projetos, porém confia a Jesus sua excecução. Se forem para Sua glória, Ele há de executá-los por ti ou por outros ainda mais débeis do que tu. Deus não tem necessidade de tuas obras. Ele quer apenas que tenhas a disposição sincera de executar aquilo que te impôs.

Se Ele precisar de criaturas para levar avante grandes empreendimentos, saberá formá-las. Irá buscá-las entre aquelas que não se apóiam na própria força, habilidade ou mérito.

E agora, minha alma, repele toda a confiança em ti mesma, ama a Jesus, oculta-se em Seu Coração, encarrega-O de fazer de ti uma grande santa (alma). Ele o fará certamente.

(Excertos do livro: O Divino Amigo - Pe. Schrijvers)

PS: Grifos meus
Ver também : O Grande Combate